A MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO: CONCEITOS BÁSICOS, USOS E APLICAÇÕES
Ana Silvia Pereira de Moura Bellico tem 20 anos e é graduanda pela PUC Minas. É integrante do GEMedE - Grupo de Estudos em Mediação Empresarial - e autora do texto.
Dar-se o nome de mediação a um dos dispositivos utilizados em métodos alternativos de resolução de conflitos, em que há protagonismo das partes. Tal método voluntário tem características próprias as quais auxiliam que duas ou mais partes,com a ajuda de uma terceira pessoa imparcial ou a um painel de indivíduos sem interesse na causa (mediador/es) que catalisam e facilitam a negociação, guie os envolvidos diretos a encontrarem por si só soluções consensuais ao conflito em questão. Assim como posto porFernanda Tartuce, a mediação é um meio no qual o mediador age “para facilitar a comunicação entre os envolvidos para propiciar que eles possam, a partir da percepção ampliada dos meandros da situação controvertida, protagonizar saídas produtivas para o impasse que os envolvem” [1]. Diversos temas podem ser objetos de mediação e são vários os países que a utilizam como forma de resolução de conflitos, aplicando-a nas mais diversas formas, estilos e habitualidades. É imperativo ressaltar o caráter universal da mediação, visto que é atuante no sistema do common law (onde se encontra muito desenvolvida[2]), bem como no civil law. Tal método seencontra presente tanto no Brasil, quanto nas mais diversas nações.
Adotado pelo Estado brasileiro, o civil law detém a característica de um direito codificado e escrito, com a intenção de aplicação objetiva de visão técnica enquadrada nos moldes do ordenamento jurídico [3]; assim, as formas alternativas de resolução de conflitos devem ser usadas de forma cuidadosaa fim de não extrapolar o direito objetivo, suas interpretações e amplitudesaceitáveis. Logo, a mediação no país ainda é tímida, mas ganha cada vez mais visibilidade e incentivo por parte de empresas, administração pública, agências e instituições de ensino. O país avança construindo um modelo de mediação próprio a ser consolidado, sendo que um fator importante para o crescimento de tal modalidade de resolução de conflitos é a Lei de Mediação, juntamente com a Resolução n. 125 do CNJ e o novo Código de Processo Civil; mecanismos esses que propulsionaram a cultura da mediação fazendo com que esta ganhasse força e efetivamente se desenvolvesse no Brasil[4]. Esse instituto evoluiu de forma notória nos últimos anos, despontando como meio eficaz e menos oneroso para uma solução consensual entre as partes visando a relação ganha-ganha, seja entre duas empresas, entre uma pessoa física e uma pessoa jurídica ou ainda entre duas pessoas físicas, o que consecutivamente colaborou para aliviar as demandas ao Poder Judiciário, o que pode ser percebido pelos dados do relatório Justiça em Números 2020, o qual mostra que após o Novo Código de Processo Civil (CPC) entrar em vigor em 2016 e tornar obrigatória a realização de audiência prévia de conciliação e mediação, aproximadamente 31,5% de todos os processos que tramitaram no Poder Judiciário foram solucionados[5].
Seguindo essa premissa, ao tratar da mediação no âmbito mundial tem-se as mais diversas formas de aplicação desta a depender da história e cultura das diferentes civilizações [3]. Nos Estados Unidos da América, utilizadores do common law,sistemaregido por jurisprudências, atendo-se a um direito costumeiro que enfatiza a pacificação dos envolvidos na controvérsia, a mediação se encontra altamente desenvolvida,com aceitação tanto no Poder Judiciário, quanto no setor extrajudicial, com expansão da mediação privada e comercial,dos cursos de resolução de disputas, além daproliferação de treinamento em mediação para advogados; dessa forma, os processos nos tribunais diminuíram consideravelmente, e o método passou a ser muito mais usado [6]. Na Europa, refletindo a historiografia particular da mediação familiar,tal instituto é altamente aplicável em todos os países da União Europeia,promovendo ativamente os modos de resolução alternativa de litígios no âmbito civil e comercial até mesmo em casos de partes em diferentes nações, desde que pelo menos uma das partes tenha domicílio num Estado‑Membro [7].Já no Oriente, a mediação tem tradição milenar ao integrar usos e costumes, sendo a forma mais comum de resolução de conflitos tanto nas comunidades chinesas, onde predominava a convivência familiare o chefe de família, valendo-se da mediação, utilizava sua sabedoria para auxiliar a solucionar conflitos;quanto nas comunidades japonesas, nas quaisexiste a figura do Chotei atuante nos conflitos de direito de família [8].Na África são realizadas convocações de assembleias -Juntas de Vizinhança-lideradas por uma associação ou pessoas respeitadas na comunidade para realizarem a mediação[8]. Por fim, na América Latina, o desenvolvimento de meios alternativos de solução de conflitos vem ganhando atenção, o que pode ser exemplificado com o caso da Argentina que, em dez anos, desenvolveu o Plano Nacional de Mediação em que leis foram aprovadas regulando a mediação pré-judicial de caráter obrigatório no processo civil ecomercial, além do Serviço de Conciliação do Trabalho [9].
Modernamente, a mediação vem se firmando como modo de regulação da conduta humana, traduzindo-se, portanto, como prática social.Dessa forma, é notória a importância que esta vem ganhando nos últimos anos de maneira global, sendo reconhecida as vantagens e benefícios que o método traz, fatores que incentivam a ampliação de seu uso e aplicação. Como posto por Juan Vezzulla a“mediação é a técnica privada de solução de conflitos que vem demonstrando, no mundo, sua grande eficiência nos conflitos interpessoais”[10].Assim, tal instituto traz proveitos inegáveis à justiça comum, desafogando-a e acelerando seus processos e, para as comunidades no geral, auxiliando na formação de uma sociedade emancipada que possa ser capaz de, nos casos em que for possível, solucionar seus próprios conflitos de maneira ativa. Em uma modernidade em que o mundo busca cada vez mais a autonomia e oequilíbrio, a mediação se mostra como instrumento que vale a pena ser destacado a fim de que perguntas como: “Será que a derrota do meu adversário irá resolver definitivamente o problema? Será que a sentença judicial deu ao caso a solução que realmente se esperava? Será que os efeitos dessa sentença serão favoráveis? Será que existe um modo de resolver melhor essa questão?” [7] possam ser respondidas de forma a satisfazer os mais diversos interesses.A mediação é inescapável a essência humana visto que o homem é ser social por excelência, logo, é mister que haja o aperfeiçoamento progressivo desta em todo o mundo de maneira a atender, da melhor forma, as demandas de cada cultura.
Referências
[1] TARTUCE, Fernanda. Mediação nos Conflitos Civis.2.ed. rev., atual. e amp. São Paulo:Gen/Método,2015
[2] LEITE, Gisele. Um Breve Histórico Sobre a Mediação. Disponível em: https://professoragiseleleite.jusbrasil.com.br/artigos/437359512/um-breve-historico-sobre-a-mediacao
[3] ANDERSON, Patrick.O Civil Law e o Common Law e a Arbitragem. Disponível em:https://patrickandersonsantos.jusbrasil.com.br/artigos/466317032/o-civil-law-e-o-common-law-e-a-arbitragem#:~:text=O%20civil%20law%2C%20det%C3%A9m%20a,que%20os%20termos%20sejam%20convencionados
[4] PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. A mediação no direito brasileiro: evolução, atualidades e possibilidades no projeto do novo Código de Processo Civil. Jun 2011. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-processual-civil/a-mediacao-no-direito-brasileiro-evolucao-atualidades-e-possibilidades-no-projeto-do-novo-codigo-de-processo-civil/
[5] Dados do Justiça em Números 2020, Conselho Nacional de Justiça, Departamento de Pesquisas Judiciárias. Disponível em:https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/08/WEB-V3-Justi%C3%A7a-em-N%C3%BAmeros-2020-atualizado-em-25-08-2020.pdf4
[6] Academia MOL. Mediação Internacional: Como A Mediação É Aplicada Em Outros Países?. Abril 2018. Disponível em:https://mediacaonline.jusbrasil.com.br/artigos/601514702/mediacao-internacional-como-a-mediacao-e-aplicada-em-outros-paises
[7] Europen Justice. Panorama da mediação na UE, 2020. Disponível em: https://e-justice.europa.eu/content_eu_overview_on_mediation-63-pt.do
[8] SILVA, Edison Ferreira da. Breve História da Mediação no Mundo. Disponível em: https://estudoemfocosaude.com.br/breve-historia-da-mediacao-no-mundo/#:~:text=Ao%20lado%20dos%20Estados%20Unidos,Lisa%20Parkinson%2C%20como%20se%20tratava
[9] LUDWIG, Frederico Antônio Azevedo. A evolução histórica da busca por alternativas eficazes de resolução de litígios no Brasil. Dez 2012. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-processual-civil/a-evolucao-historica-da-busca-por-alternativas-eficazes-de-resolucao-de-litigios-no-brasil/
[10]VEZZULLA, Juan Carlos. Teoria e prática da Mediação. Curitiba: Instituto de Mediação, 1995
Bibliografia
Manual de Mediação Judicial 2015, Conselho Nacional de Justiça
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. O que é mediação? Disponível em: http://www.tjrj.jus.br/web/guest/institucional/mediacao/estrutura-administrativa/o-que-e-mediacao
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. A uniformidade e a estabilidade da jurisprudência e o estado de direito – Civil law e Common law. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 57, n. 384, out, 2009
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UWAZIE, ErnestE.Resolução Alternativa de Litígios em África: Prevenir o Conflito e Reforçar a Estabilidade.Nov. 2011. Disponível em: https://africacenter.org/wp-content/uploads/2016/06/ASB16PT-Resolu%C3%A7%C3%A3o-Alternativa-de-Lit%C3%ADgios-em-%C3%81frica-Prevenir-o-Conflito-e-Refor%C3%A7ar-a-Estabilidade.pdf
LEE, Chloe. Quais são as novidades da mediação internacional na Europa?. Jan 2021. Disponível em: https://imimediation.org/pt/2021/02/01/whats-next-for-international-mediation-in-europe/
FILHO, Levy Pinto de Castro. Panorama atual da mediação de conflitos no Brasil - atualidade jurídica e vivências. Dez 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70806/panorama-atual-da-mediacao-de-conflitos-no-brasil-atualidade-juridica-e-vivencias
PINTO, Simone;GOUVÊA,Guaracira. Mediação: significados, usos e contextos. Revista Ensaio, Belo Horizonte, v.16, n. 02, maio-ago 2014. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/epec/v16n2/1983-2117-epec-16-02-00053.pdf